Resíduos químicos usados na produção têxtil podem ser até mesmo cancerígenos


O impacto da produção de roupas na saúde dos consumidores vai além da aparência. O rastro de poluição deixado durante a fabricação de peças caras é venenoso, denuncia o Greenpeace. "A indústria da moda usa rios como esgoto em todo o mundo", afirma Manfred Santen, que faz parte da organização na Alemanha.

A preocupação do ambientalista se concentra nos produtos químicos usados no processo de manufatura e fabricação das roupas. Muitos dos produtos são cancerígenos ou afetam o sistema hormonal. "Esses químicos acabam despejados pelas fábricas nos rios dos países responsáveis pela produção", explica Santen.
Mais tarde, onde essas mercadorias são comercializadas, mais toxinas são liberadas durante a lavagem das roupas. O problema é globalizado e coloca em risco tanto a água para consumo humano como os peixes. Mesmo que o produto exposto na prateleira não seja tóxico, ele pode ter sido produzido com substâncias perigosas.
Por outro lado, Santen se diz otimista e conta com uma melhora do panorama. Ele acredita que, no futuro próximo, muitas marcas irão produzir camisetas e jeans de forma limpa.
Não existem marcas sem veneno
Todas as marcas líderes de mercado usam produtos químicos perigosos. Isso foi provado pelo Greenpeace no ano passado. A pedido da organização, laboratórios independentes avaliaram a presença de agentes químicos tóxicos em 141 peças feitas em 29 países. Foram analisadas roupas como calças, jeans, vestidos, camisetas e roupas íntimas vindas das marcas Armani, Benetton, C&A, Calvin Klein, Diesel, Esprit, Gap, H&M, Jack&Jones, Levi's, Mango, Metersbonwe, Only, Tommy Hilfiger, Vero Moda, Victoria's Secret e Zara.
Os resultados deixaram Santen surpreso. "Embora não tenhamos encontrado químicos em todas as peças de roupas, encontramos em todas as marcas", comenta. Ele cita o exemplo da marca Zara. Uma calça feita no Paquistão tinha substâncias cancerígenas derivadas de corantes azoicos. Já em uma jaqueta infantil foi encontrado alquifenol etoxilado, conhecido como APEO. Os fabricantes usam esse produto para a limpeza de fios e roupas.
Essa substância é poluente e especialmente venenosa para os ambientes aquáticos. "Esse fato é conhecido há 30 anos", explica Alex Föller, diretor da organização Tegewa. A entidade representa empresas do setor químico que fornecem produtos usados no processo têxtil para o tratamento e limpeza dos materiais.
Companhias alemãs decidiram voluntariamente suspender o uso de alquifenóis em detergentes industriais em 1986. Em toda a União Europeia, o uso dessas substâncias é estritamente controlado. Desde 2005, os produtos dessa natureza podem ser usados apenas quando não despejados na rede de esgoto. No entanto, no resto do mundo, faltam regras mais rígidas.
Föller argumenta que químicos poluentes como os alquifenóis podem ser substituídos por outras substâncias não venenosas. Ele assegura que existem alternativas que não geram nenhum tipo de produto perigoso que possa envenenar peixes.
Moda química
O Greenpeace acusa as cadeias de moda de oferecerem produtos que usam desnecessariamente químicos poluentes em seu processo de fabricação. As empresas reagiram às alegações. Desde 2011, quando a organização começou a campanha Detox, empresas como Adidas, Nike e H&M e outras grandes 17 marcas assumiram o compromisso de abandonar químicos poluentes em suas cadeias produtivas até 2020. A Zara anunciou que desde maio deste ano já não usa mais alquifenóis no processo de fabricação das suas roupas.
O Greenpeace apela aos fabricantes para que cumpram suas promessas. "Nós queremos saber exatamente quando e qual químico cada cadeia de loja deixou de usar", afirma Santen. A organização quer controlar de perto as mudanças.
O ambientalista sabe, porém, que as promessas geram grandes desafios. "Geralmente, as empresas não sabem o que e onde outras empresas da cadeia produzem para a marca." Esta situação é ainda mais comum nas chamadas marcas de fast-fashion, como H&M e Zara. Essas marcas lançam constantemente novas coleções, com curto intervalo entre criação, produção e venda nas lojas.
Por trás disso está um grande esforço de logística, "o que dificulta que se tenha uma visão completa de cada produto têxtil fabricado", explica. O problema está na complexidade da organização da cadeia de fornecedores. O representante do setor, Alex Föller, dá um exemplo. "Uma empresa têxtil tem, talvez, 100 ou 200 fornecedores diretos na China, Paquistão e Bangladesh que produzem o material que será usado posteriormente na confecção".
Föller explica que esses fornecedores, por sua vez, compram os químicos que precisam para o processamento dos produtos têxteis de diferentes empresas e que muitas delas são empresas familiares. "Caso algum fornecedor falhe, um cunhado ou um primo passa a fornecer os produtos químicos", exemplifica. No final, não há uma visão geral do processo.
Químicos limpos não são caros
Föller acredita que a substituição dos químicos poluentes por outros mais limpos não deve pesar no bolso de quem compra uma calça ou uma camiseta. O controle é que pode custar caro. "As empresas devem fazer ao menos testes por amostragem para verificar o que seus fornecedores estão usando", sugere. Para isso, Föller tem uma alternativa. "Os fornecedores devem saber que correm o risco de serem expulsos do sistema de produção se violarem as orientações".
A indústria automobilística mostra que esse tipo de ameaça costuma funcionar. Há anos os fornecedores devem garantir que seus produtos não possuam substâncias venenosas ou vestígios delas. O mesmo vale para os fornecedores das capas dos bancos dos automóveis, explica Hans Pfeil. Ele coordena o departamento de Toxicologia da Ford, em Colônia. "Se descobrimos que nossas exigências não estão sendo cumpridas, esclarecemos a situação com rigor", ressalta.
Ele explica que se o fabricante não conseguir apontar a fonte do problema, ele não poderá mais fornecer para a empresa. A ameaça surtiu efeito. As capas de banco usadas pela Ford podem conter apenas vestígios dos poluentes aquifenóis. Antes de a parte têxtil chegar à montadora, ela é lavada para eliminar os químicos poluentes. A alternativa é usar elementos substitutos não venenosos.
Para o Greenpeace isso não é o bastante. Se os químicos poluentes forem eliminados de vez da cadeia produtiva, então rios de Bangladesh, China e Vietnã ficarão mais limpos, e a saúde do consumidor final correrá menos risco. No entanto, o exemplo da indústria automobilística deixa claro que mesmo grandes cadeias produtivas podem ser controladas.  
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