Quarta, 15 de outubro de 2014
"Praticamente todos os dias almoço em casa. Faço minha comida. Escolho o que penso me alimentar e ser, ao mesmo tempo, saudável para o planeta e as pessoas. Não é nenhum sacrifício ou ritual desagradável", escreve Giuliana Capello, jornalista ambiental, em artigo publicado pelo site Mundo Sustentável, 07-10-2014.
Eis o artigo.
Ontem eu estava conversando com um amigo que trabalhou, anos atrás, como fotógrafo de gastronomia. Naquela época, o dia a dia dele, na Inglaterra, era fazer fotos de belos pratos, mesas bem montadas, tudo para dar um toque de “coisa fina” àqueles punhados de comida. Com o passar do tempo, no entanto, a busca pela melhor imagem deu lugar a um questionamento sobre a origem dos ingredientes. Café, diversos tipos de chás, chocolates, frutas tropicais, tudo vinha de longe, de outros países, sem que tivessem, muitas vezes, uma boa história para contar. Ao contrário, não seria incomum descobrir casos de exploração de agricultores, excessos de agrotóxicos e pesticidas, trabalho em regime de escravidão, entre outros males socioambientais – como, por exemplo, a enorme pegada ecológica do país, que importa uma parte considerável do que consome à mesa.
Dessa experiência, nasceu no fotógrafo a vontade de plantar seu próprio alimento e de redirecionar seu olhar para belezas mais autênticas. Ele, que é sul-africano com família na Escócia, casou-se com uma brasileira e trocou Edimburgo por um sítio em terras mineiras, com direito a doce de leite da vizinha toda semana.
Essa história me fez pensar sobre por que nunca vi graça nos cardápios das redes de fast food. Há quem salive de desejo ao ver um sanduíche com hambúrguer bovino, tomate, queijo, alface, ketchup, mostarda e uma fatia de bacon. Mas, para mim, o mundo que se esconde atrás desses sabores combinados para serem viciantes está muito longe da ideia esdrúxula de “lanche feliz”. Para mim, eles sintetizam um leque de aberrações que precisam desaparecer, acabar de uma vez por todas, sumir do planeta.
Já sabemos dos problemas da criação de animais confinados à base de antibióticos e hormônios. Sabemos que o regime de pecuária extensiva também é muito nocivo, especialmente às florestas, destruídas para ceder lugar a pastagens que degradam o solo, a biodiversidade e as fontes de água. E também já tivemos informações o bastante acerca da produção industrial de carnes embutidas, com quantidades absurdas de conservantes e outros químicos que insistem em disfarçar a “feiúra” desses alimentos com aromas e maciez artificiais.
Produzir leite e queijo em grande escala também acumula uma lista enorme de impactos ambientais, sem falar nos prejuízos à saúde que uma dieta recheada de laticínios pode causar. E o que dizer das lavouras de tomate e alface? Tomate nos EUA é quase sinônimo de imigrantes latinos (mexicanos, principalmente) trabalhando ilegalmente, sob condições prá lá de precárias.
Que beleza tem essa comida? Nenhuma, nem com Photoshop. Onde mora a beleza e o charme dos chás que viajam em contêineres de navios, escuros o bastante para nos fazer esquecer que suas folhas foram colhidas por mãos que trabalharam sob sol e chuva, por menos de um dólar por dia?
Quando comemos ou bebemos desses alimentos, alimentamos menos nosso organismo e mais esse submundo criminoso que, há tempos, está destruindo nosso planeta e nossa esperança na humanidade. Nosso prato revela nosso mundo. E é por isso que acredito ser fundamental revolucionar nosso cardápio – e, assim, pressionar e provocar mudanças também no campo e na indústria.
Praticamente todos os dias almoço em casa. Faço minha comida. Escolho o que penso me alimentar e ser, ao mesmo tempo, saudável para o planeta e as pessoas. Não é nenhum sacrifício ou ritual desagradável. Muito pelo contrário! Cada ingrediente que compõe minhas refeições me faz mais feliz e convicta das minhas escolhas.
Não são cardápios chiques, são cardápios decentes, nutritivos e saborosos. Dia desses, por exemplo, meu prato no almoço tinha: arroz cateto integral e biodinâmico (comprado de uma amiga que faz contato direto com os produtores); couve e folhas de beterraba da pequena horta orgânica da ecovila, refogadas por dois minutos, só para ficarem mais macias; alface roxa e alface romana da mesma horta; abobrinha (também da horta) cozida no vapor com orégano fresco do meu jardim; folhas e flores de capuchinha colhidas no meu quintal, temperadas com molho pesto feito em casa (e com manjericão da minha espiral de ervas medicinais); e omelete com salsinha e cebolinha do quintal e ovo caipira orgânico do amigo e agrônomo que mora aqui na ecovila (o ovo é caipira porque as galinhas são criadas em grande espaço, comem minhocas e outros bichinhos que encontram na terra o dia todo, tomam banho de sol etc., e é orgânico porque a ração das galinhas, que complementa a dieta delas, é certificada e, claro, também não leva nem soja nem milho transgênico).
Ah, sim! E ainda tinha suco de limão do pomar da ecovila com folhas de erva doce do meu quintal e água pura da nossa nascente! Um luxo de simplicidade!
Uma beleza para sonhar com um mundo cada vez melhor. Deu vontade de fotografar. A mesa estava linda! Linda de se ver, saborear e contar suas histórias…
Eis o artigo.
Ontem eu estava conversando com um amigo que trabalhou, anos atrás, como fotógrafo de gastronomia. Naquela época, o dia a dia dele, na Inglaterra, era fazer fotos de belos pratos, mesas bem montadas, tudo para dar um toque de “coisa fina” àqueles punhados de comida. Com o passar do tempo, no entanto, a busca pela melhor imagem deu lugar a um questionamento sobre a origem dos ingredientes. Café, diversos tipos de chás, chocolates, frutas tropicais, tudo vinha de longe, de outros países, sem que tivessem, muitas vezes, uma boa história para contar. Ao contrário, não seria incomum descobrir casos de exploração de agricultores, excessos de agrotóxicos e pesticidas, trabalho em regime de escravidão, entre outros males socioambientais – como, por exemplo, a enorme pegada ecológica do país, que importa uma parte considerável do que consome à mesa.
Dessa experiência, nasceu no fotógrafo a vontade de plantar seu próprio alimento e de redirecionar seu olhar para belezas mais autênticas. Ele, que é sul-africano com família na Escócia, casou-se com uma brasileira e trocou Edimburgo por um sítio em terras mineiras, com direito a doce de leite da vizinha toda semana.
Essa história me fez pensar sobre por que nunca vi graça nos cardápios das redes de fast food. Há quem salive de desejo ao ver um sanduíche com hambúrguer bovino, tomate, queijo, alface, ketchup, mostarda e uma fatia de bacon. Mas, para mim, o mundo que se esconde atrás desses sabores combinados para serem viciantes está muito longe da ideia esdrúxula de “lanche feliz”. Para mim, eles sintetizam um leque de aberrações que precisam desaparecer, acabar de uma vez por todas, sumir do planeta.
Já sabemos dos problemas da criação de animais confinados à base de antibióticos e hormônios. Sabemos que o regime de pecuária extensiva também é muito nocivo, especialmente às florestas, destruídas para ceder lugar a pastagens que degradam o solo, a biodiversidade e as fontes de água. E também já tivemos informações o bastante acerca da produção industrial de carnes embutidas, com quantidades absurdas de conservantes e outros químicos que insistem em disfarçar a “feiúra” desses alimentos com aromas e maciez artificiais.
Produzir leite e queijo em grande escala também acumula uma lista enorme de impactos ambientais, sem falar nos prejuízos à saúde que uma dieta recheada de laticínios pode causar. E o que dizer das lavouras de tomate e alface? Tomate nos EUA é quase sinônimo de imigrantes latinos (mexicanos, principalmente) trabalhando ilegalmente, sob condições prá lá de precárias.
Que beleza tem essa comida? Nenhuma, nem com Photoshop. Onde mora a beleza e o charme dos chás que viajam em contêineres de navios, escuros o bastante para nos fazer esquecer que suas folhas foram colhidas por mãos que trabalharam sob sol e chuva, por menos de um dólar por dia?
Quando comemos ou bebemos desses alimentos, alimentamos menos nosso organismo e mais esse submundo criminoso que, há tempos, está destruindo nosso planeta e nossa esperança na humanidade. Nosso prato revela nosso mundo. E é por isso que acredito ser fundamental revolucionar nosso cardápio – e, assim, pressionar e provocar mudanças também no campo e na indústria.
Praticamente todos os dias almoço em casa. Faço minha comida. Escolho o que penso me alimentar e ser, ao mesmo tempo, saudável para o planeta e as pessoas. Não é nenhum sacrifício ou ritual desagradável. Muito pelo contrário! Cada ingrediente que compõe minhas refeições me faz mais feliz e convicta das minhas escolhas.
Não são cardápios chiques, são cardápios decentes, nutritivos e saborosos. Dia desses, por exemplo, meu prato no almoço tinha: arroz cateto integral e biodinâmico (comprado de uma amiga que faz contato direto com os produtores); couve e folhas de beterraba da pequena horta orgânica da ecovila, refogadas por dois minutos, só para ficarem mais macias; alface roxa e alface romana da mesma horta; abobrinha (também da horta) cozida no vapor com orégano fresco do meu jardim; folhas e flores de capuchinha colhidas no meu quintal, temperadas com molho pesto feito em casa (e com manjericão da minha espiral de ervas medicinais); e omelete com salsinha e cebolinha do quintal e ovo caipira orgânico do amigo e agrônomo que mora aqui na ecovila (o ovo é caipira porque as galinhas são criadas em grande espaço, comem minhocas e outros bichinhos que encontram na terra o dia todo, tomam banho de sol etc., e é orgânico porque a ração das galinhas, que complementa a dieta delas, é certificada e, claro, também não leva nem soja nem milho transgênico).
Ah, sim! E ainda tinha suco de limão do pomar da ecovila com folhas de erva doce do meu quintal e água pura da nossa nascente! Um luxo de simplicidade!
Uma beleza para sonhar com um mundo cada vez melhor. Deu vontade de fotografar. A mesa estava linda! Linda de se ver, saborear e contar suas histórias…
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