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Ambientalistas dirigem carta a candidatos com dez ações fundamentais para recuperar a Mata Atlântica

 


 

 

 
Mata Atlântica
 
A criação de novas unidades de conservação e a regulamentação do Fundo de Restauração da Mata Atlântica, que está previsto em lei há oito anos, são duas das dez ações fundamentais descritas na Carta da Mata Atlântica 2014, documento preparado por ONGs ambientais para servir de Plataforma Ambiental a ser enviada aos candidatos às próximas eleições, em todas as instâncias nos 17 estados da Mata Atlântica. O documento foi resultado do Seminário da Semana da Mata Atlântica, que acaba de acontecer, na Escola de Astrofísica do Parque do Ibirapuera, em São Paulo.
 
Esta foi a décima edição do evento, realizado pela Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, da Rede de ONGs da Mata Atlântica ,Ministério do Meio Ambiente (MMA),além do apoio da Fundação SOS Mata Atlântica e da Cooperação Alemã para o Desenvolvimento Sustentável (GIZ) e de representantes de organizações dos 17 estados do bioma Mata Atlântica.
 
A Mata Atlântica é o bioma mais ameaçado do Brasil e o segundo do Planeta, globalmente reconhecido como prioridade para ações de conservação da biodiversidade, dos serviços ambientais e demais recursos naturais. Isso acontece não apenas por sua sociobiodiversidade inigualável, que está desaparecendo, mas também por sua importância para a manutenção da qualidade de vida de mais de 60% da população brasileira que habita seu território.
 
A deterioração do bioma, causada por um modelo de desenvolvimento que privilegia grandes projetos públicos e privados, planejados e implementados sem os devidos cuidados socioambientais, gera problemas como a perda de biodiversidade e dos serviços ambientais prestados pelos ecossistemas, como a regulação da quantidade e da qualidade da água.
 
O resultado mais visível dessa situação hoje na Mata Atlântica é a ocupação indiscriminada de morros e áreas de mananciais. Com isso, a população passa a conviver com enchentes e desabamentos em épocas de fortes chuvas e falta de água em tempos de seca, entre muitos outros problemas. Um retrospecto recente das consequências disso vão desde perdas econômicas – em um território que corresponde a 70% do PIB brasileiro – e de qualidade de vida nas cidades, até perdas de vidas humanas.
 
É por isso que a situação crítica da Mata Atlântica tem mobilizado diversos setores da sociedade, que exigem ações e políticas capazes de assegurar sua conservação e restauração. No entanto, na contramão das necessidades, estamos vivenciando um grande retrocesso na política socioambiental brasileira, que impacta negativamente tanto a Mata Atlântica como os demais biomas presentes no país.
 
Nesse contexto, a Rede de ONGs da Mata Atlântica e da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, apresenta dez ações fundamentais e emergentes para reversão das degradações e proteção do bioma.
 
1- Retomar a agenda de criação e implantação de áreas protegida;
2- Regulamentar o Fundo de Restauração da Mata Atlântica (previsto em lei há oito anos);
3- Estruturar de maneira adequada os órgãos responsáveis pelo cumprimento do Código Florestal brasileiro (em vigor há dois anos);
4- Implantar, de forma qualificada, transparente e com participação social, os instrumentos do Código Florestal brasileiro, como o Cadastro Ambiental Rural, a restauração florestal e os incentivos econômicos e fiscais, para a sua total efetivação;
5- Estabelecer um marco legal sobre Pagamento por Serviços Ambientais, em consonância com o Código Florestal brasileiro e propor a criação de leis e programas similares nos estados e municípios;
6- Criar programas, em âmbito federal e estaduais, de fomento a elaboração e implementação dos Planos Municipais de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica;
7- Rearticular e fortalecer o Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama) como principal instrumento de gestão da política ambiental nacional, com participação e controle social;
8- Estabelecer um plano de ação para o cumprimento e monitoramento das Metas da Convenção da Diversidade Biológica (Metas de Aichi) voltadas para conter as perdas de biodiversidade no bioma, envolvendo e fomentando os estados e diversos seguimentos da sociedade;
9- Promover ampla discussão com a sociedade sobre megaempreendimentos, públicos e privados, que impactam o bioma;
10- Integrar as Políticas Públicas, nas três esferas da federação, tais como recursos hídricos, meio ambiente, agroecologia e mudanças climáticas, para a conservação e preservação do bioma.
 
Colaboração de José Antônio Araújo, para o EcoDebate, 29/05/2014

do portal EcoDebate

Bichos tristes


 

 

A crueldade das carroças em Brasília
por Consuelo Dieguez
 
A ponte Juscelino Kubitschek, em Brasília, que liga o Lago Sul ao Centro da capital, é considerada uma das belezas da cidade. É sustentada por três grandes arcos assimétricos, projetados de forma a sugerir o movimento de uma pedra chapinhando sobre o lago Paranoá. Inaugurada em 2002, a obra monumental consumiu quatro vezes o valor orçado inicialmente. Tem duas pistas com seis faixas de rolamento e uma vistosa sinalização nas extremidades indica que a velocidade máxima ali permitida é de 60 quilômetros por hora; pedestres e ciclistas devem respeitar os espaços a eles destinados; e, finalmente, não menos importante, a circulação de carroças na via não é permitida.
A placa redonda, estampada com a figura de uma carroça puxada por um cavalo desenxabido, cortada por uma faixa vermelha de proibido, pode parecer exótica para forasteiros, principalmente os das grandes capitais. Mas, para os moradores de Brasília, o alerta procede. Carroças com tração animal costumam circular livremente pela cidade.
Em tese, elas já deveriam ter sido banidas das ruas. Mas o governo do Distrito Federal faz vista grossa para os carroceiros porque não sabe como realocá-los em outra atividade. Pobres e, na maioria, analfabetos, sem preparo para outro tipo de trabalho, eles ganham a vida catando todo tipo de refugo: ferro velho, papelão, entulhos de obra. Na maior parte das cidades, a tralha geralmente é transportada em caçambas puxadas por potentes caminhões. Em Brasília, é levada em carroças assentadas em lombos de cavalo.
José da Conceição é um homem negro, magro e de altura mediana. A pele encarquilhada e a boca murcha, sem a maior parte dos dentes, lhe dão a aparência de um velho de antigas fotografias, embora tenha 50 anos recém-completados. No começo de uma tarde abafada de abril, ele tentava organizar o lixo – sua mercadoria – acumulado num terreno baldio no final da Asa Norte, região valorizada do Plano Piloto. O papelão para reciclagem estava empilhado no chão de terra batida. Ferro e restos do que algum dia foram móveis estavam embolados sobre a vegetação rasteira. Mais ao fundo, escondida sob arbustos do cerrado, estava sua carroça, carregada de entulho, atrelada a um cavalo arqueado pelo peso. José da Conceição se aproximou do animal e acariciou sua cabeça.
O cavalo cinza chama-se Badulaque e é ainda um potro. O dono diz tratar bem o bicho, apesar da pesada carga que coloca sobre ele. Contou que fez curso de carroceiro ministrado por técnicos do governo. Ensinaram-lhe a dar ração, vacinas e vitaminas. Também disseram que a carga máxima suportada pelo animal seria de 300 quilos. Mas ele admite que Badulaque costuma carregar o dobro. “Se não for subida ele aguenta bem.” Alega que “cavalo foi feito para trabalhar”.
 
Suando em bicas e espantando as moscas à sua volta, o ex-sargento Fernando Alcântara, vestindo um pesado terno de risca de giz, acompanhava com desgosto a fala de José da Conceição. Alcântara abandonou o Exército há seis anos após sofrer uma dura perseguição da corporação em razão da sua relação homossexual com o companheiro, também sargento, Laci Marinho de Araújo, aposentado por motivo de saúde. Inconformados com os maus-tratos aos animais, os dois criaram em Brasília uma ONG, o Instituto Ser, para lutar pelos “direitos humanos e da natureza”.
Alcântara foi procurado por partidos políticos para que concorresse a uma vaga na Câmara Distrital. Chegou a se filiar ao PSB, mas deixou o partido quando este passou a abrigar a ex-senadora Marina Silva. “Essa mulher é uma fundamentalista religiosa e essas seitas evangélicas são as que mais perseguem os homossexuais”, disse. Bandeou-se para o PCdoB e sairá candidato a deputado distrital, com a bandeira da defesa dos animais.
O caso dos cavalos de carga, segundo Alcântara, é dos mais tristes. “Eles são trazidos ao centro veterinário da Universidade de Brasília com as patas sangrando e o lombo cheio de feridas”, contou. “São tratados com muita crueldade pelos donos.” Alguns animais chegam a ser cegados pelos carroceiros para não se assustarem com o trânsito. Muito deles são velhos e trabalham até morrer por exaustão. Outros tantos são sacrificados ao terem as patas quebradas pelo excesso de peso que carregam. O ex-sargento queria que fossem levados para um santuário.
Há alguns meses, Alcântara iniciou uma campanha para que cavalos e carroças fossem substituídos por uma bicicleta movida a bateria, acoplada
a uma carroceria coberta. Pareceu-lhe uma ótima solução. “Os carroceiros não perderiam seu trabalho e os animais não seriam sacrificados.” Mas não considerou o custo do veículo – 12 mil reais cada. Como não encontrou quem bancasse o projeto, a ideia não foi adiante.
 
Filmado todo o tempo por Laci, Alcântara perguntou a José da Conceição se ele trocaria a carroça por um veículo diferente, caso fosse possível. O carroceiro disse que já tentou ter uma Kombi, mas, como é analfabeto, é proibido de dirigir. Não lhe sobraria outra alternativa que não a carroça. “Estou cansado de levarem meu cavalo para o depósito. Tenho que ir ao banco pagar uma taxa para soltá-lo e logo o prendem de novo”, reclamou. “É uma espécie de sequestro e eu tenho que pagar fiança.”
Num português perfeito, José da Conceição contou que, antes de ser carroceiro, era traficante. Mas agora, com o trabalho, tem “uma vida digna”, com mulher e filhos. “É claro que eu queria estar num gabinete com ar-condicionado e ser chamado de doutor José, mas não tenho essa chance”, disse. “Sou xingado pelos motoristas, perseguido pela fiscalização, mas sou menos invisível do que quando era traficante.”
Em seguida, o carroceiro reclamou da situação que considera injusta. “Dou muito mais duro que esses deputados distritais e vivo aqui nessa sujeira e pobreza.” Naquele dia, o Correio Braziliense havia noticiado que os 24 deputados distritais trabalhavam apenas às terças-feiras e tinham gastos de cerca de 200 mil reais por gabinete. Conceição voltou-se para Alcântara e apelou. “Espero que sua ONGpossa nos tirar dessa vida.” É o que ele promete. 

"O futuro nos leva para o lixo zero, para a economia circular, a reutilização total".

            
“O futuro nos leva para o lixo zero, para a economia circular, para a reutilização total, por isso, precisamos de profissionais que pensem em mudar o processo de produção, mudar o conceito do produto e a aplicação dele, ou seja, remodelar o sistema”, diz o engenheiro civil.
“Apesar da Política Nacional de Resíduos Sólidos - PNRS ter dado um caráter profissionalizante para o processo de coleta seletiva dos resíduos — porque nós tínhamos um movimento muito amador —, nesses quatro anos pouco se fez para a profissionalização das pessoas que trabalham com o lixo”, adverte Rodrigo Sabatini na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por telefone.
 
Na avaliação dele, os catadores, determinados pela PNRS como responsáveis pela coleta seletiva do lixo nos munícipios brasileiros, ainda não foram “aparelhados” com tecnologias. “Eles precisam de instrução, de possibilidades. E sobre o aspecto humano da questão, digo que ninguém merece botar a mão no lixo de ninguém. É uma questão de humanidade, de dignidade. Uma pessoa que se sujeita a coletar lixo para sustentar outra é uma pessoa muito digna, mas uma sociedade que permite que alguém viva do seu lixo é uma sociedade indigna”, frisa.
 
Entre as metas da PNRS, estava a de erradicar os lixões até agosto deste ano, mas provavelmente ela não será cumprida, porque apenas “30% das prefeituras já entregaram seus planos”, informa. Segundo ele, apesar de a PNRS ser uma das legislações ambientais mais modernas do mundo, “o Brasil estava totalmente despreparado para a lei”.
 
Segundo ele, entre as dificuldades, há a falta de preparo dos municípios: “85% dos municípios brasileiros têm menos de 50 mil habitantes, então a infraestrutura é muito pequena. No caso dos municípios com uma população maior, são muito complexos para implementar a política em dois anos”.
 
Na avaliação de Sabatini, com o desenvolvimento da PNRS, a principal meta deve ser a de alcançar índice de lixo zero, a exemplo do que já fazem outras cidades, como São Francisco, na Califórnia, que “encaminha para o aterro apenas 18% de todo o lixo que produz, quer dizer, 82% dos resíduos da cidade são tratados, encaminhados e voltam para a cadeia produtiva”.
 
Rodrigo Sabatini é Engenheiro Civil formado pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Atualmente é conselheiro do Instituto Lixo Zero Brasil e presidente da Novociclo Ambiental.
 
Confira a entrevista.
IHU On-Line - Como você avalia a falta de ação dos municípios frente à Política Nacional de Resíduos Sólidos, já que a maioria dos munícipios não tem Plano de Gestão?
 
Rodrigo Sabatini – Diversos fatores complicaram o cumprimento da legislação.
Primeiro, a lei foi feita no meio do mandato dos prefeitos, em 2010. Então, até eles tomarem conhecimento da lei e das ações que deveriam realizar, o mandato deles já estava perto do final; como tinham outras prioridades, deixaram o “pepino” para o próximo. Ou seja, como a lei só passaria a vigorar no ano seguinte, deixaram sua implementação para o prefeito que assumisse o próximo mandato. Então, quase todo mundo deixou para depois; só 10% dos municípios fizeram seus planos municipais na data certa.
 
Outro problema é que o Brasil estava totalmente despreparado para a lei. A Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos é a mais moderna do mundo e, talvez, a mais justa também. Ela demorou 19 anos para ser elaborada, mas foi muito bem feita e é bastante moderna em diversos fatores. Os próprios técnicos da área, engenheiros, sanitaristas, biólogos e engenheiros de produção, e a própria engenharia de modo geral, não estavam preparados para a lei. Então, essa também foi uma dificuldade. Outra dificuldade diz respeito à falta de preparo dos municípios: 85% dos municípios brasileiros têm menos de 50 mil habitantes, então a infraestrutura é muito pequena. No caso dos municípios com uma população maior, são muito complexos para implementar a política em dois anos. Entretanto, o plano de São Paulo saiu e é muito bom. Até agora, 30% das prefeituras já entregaram seus planos, mas em algumas prefeituras pequenas o projeto é muito fraco; o último que eu vi, inclusive, comparei a um trabalho escolar.

“Ninguém quer tomar conta do lixo, e esse é um problema sério”

IHU On-Line - Que tipos de ações avançaram e quais ainda devem ser aprimoradas para cumprir o que a lei prevê?
Rodrigo Sabatini – A lei diz que todo município, todo grande gerador de resíduos, deve ter um Plano de Resíduos Sólidos, não apenas para ter um plano, mas porque a partir desse plano será elaborado um sistema integrado de informação no futuro — talvez possa ser iniciado no próximo ano —, no qual a nação poderá fazer o seu planejamento. Então, foi pedido aos municípios e aos grandes geradores um diagnóstico, mas por enquanto não temos como planejar, pois não temos nem o diagnóstico.
 
Outra coisa que a lei deveria fazer após termos o diagnóstico dos municípios é estabelecer metas para chegar a um nível de 90% de reciclagem, como é feito em outros países. Os países que avançaram muito na reciclagem têm metas, e muitos deles têm metas de lixo zero.
 
Na cidade de São Francisco. EUA, a data é 2020, em outras cidades, os prazos são 2015, 2030, 2040. Cada cidade estabelece seu diagnóstico e sua meta, e isso é importante porque orienta a sociedade para aquele fim. Então, a partir do momento em que se tem uma meta, os jovens, os estudantes, os engenheiros e outros profissionais passam a ver essa meta como uma oportunidade e passam a desenvolver uma capacidade técnica para tratar dessa questão. Por enquanto, a lei visa, prioritariamente, evitar a formação do lixo.
 
A nova lei estabelece uma hierarquia, os procedimentos e a responsabilidade para evitarmos o envio de materiais para aterros. As universidades, por enquanto, estão focadas na remediação do problema, mas precisamos de profissionais para evitar o problema. O futuro nos leva para o lixo zero, para a economia circular, para a reutilização total, por isso, precisamos de profissionais que pensem em mudar o processo de produção, mudar o conceito do produto e a aplicação dele, ou seja, remodelar o sistema.
 
IHU On-Line - Em que consiste a proposta do Lixo Zero? Ela é viável?
 
Rodrigo Sabatini - O lixo zero é uma meta ética, econômica, eficiente e visionária para guiar as pessoas a mudarem seus modos de vida e suas práticas de forma a incentivar os ciclos naturais e sustentáveis, onde todos os materiais residuais são projetados permitindo seu uso no pós-consumo. Lixo Zero significa projeto de produto e gerenciamento de processos para evitar e eliminar sistematicamente o volume e a toxicidade dos resíduos e materiais, conservar e recuperar todos os recursos e não aterrá-los ou incinerá-los. Ao implementar o lixo zero, todos os descartes para a terra, água e ar são evitados, os quais são uma ameaça à saúde do planeta e dos seres vivos.
 
O que isso significa? Significa que vai se estabelecer uma meta e reunir todos os esforços, humanos, intelectuais, culturais, e o que for necessário para evitar o envio de materiais para aterros. Não é, portanto, algo mágico, mas trata-se do exercício de um planejamento, ou seja, é um programa de uma melhoria contínua. A aplicabilidade dessa proposta é total.
 
Existem empresas e indústrias que têm lixo zero e cidades que estão chegando muito perto ou vão chegar ao lixo zero em pouco tempo. O maior exemplo de uma cidade grande que tem lixo zero é a cidade de São Francisco, na Califórnia. São Francisco encaminha para o aterro apenas 18% de todo o lixo que produz, quer dizer, 82% dos resíduos da cidade são tratados, encaminhados e voltam para a cadeia produtiva. A meta de São Francisco é de ser lixo zero até 2020. Outro exemplo é a cidade de Capannori, na Itália, que tem 30 mil habitantes e é uma cidade que começou o programa do lixo zero há cerca de 10 anos e hoje é o centro de referência da Europa, com mais de 90% de encaminhamento correto do lixo. Isso fez crescer uma indústria de reciclagem e reuso em seu entorno. A cidade de Milão tem 2 milhões de habitantes e está implementando o programa lixo zero, de bairro em bairro, e o programa está funcionando muito bem e de forma rápida. 
 
Lixo

“O lixo zero é uma meta ética, econômica, eficiente e visionária para guiar as pessoas a mudarem seus modos de vida”

Lixo, para mim, é tudo aquilo que é misturado, que é uma meleca. Antes disso, podem até me descrever lixo como alguma coisa que não vou usar ou algo assim, mas se ele estiver separado, poderá ser matéria-prima de alguma coisa, e aí já não é mais lixo, é matéria-prima.
 
Agora, uma vez que se mistura tudo e se faz uma meleca, aí sim, se tem o lixo. Ao formar-se, o lixo ganha um caráter de urgência, ou seja, é urgente que se dê um destino àquele lixo. Enquanto for matéria-prima e estiver separado, pode ficar guardado durante anos.
 
Por isso, quando não tratamos o lixo, estamos criando uma situação de urgência. O caráter de urgência tem um custo político, econômico e social.
 
Tudo que é urgente pode ser contratado sem licitação, tudo que é urgente fica sujeito a um valor, ou seja, tem um custo elevado. Então, com a proposta do lixo zero, se tira o caráter de urgência de lixo das matérias-primas, que passam a ser coletadas e encaminhadas separadamente.
 
A segunda questão é a do custo. Há um movimento enorme na Itália no qual mais de 400 municípios estão indo em direção ao lixo zero. Ações como essas têm gerado revoluções em um período de no máximo 36 meses e se evidencia uma mudança de 80% de reciclagem. Com isso, o custo dos municípios tem diminuído.
 
IHU On-Line – Se planejarmos e fizermos esse plano de maneira adequada de coleta de resíduos e separação, isso economiza no orçamento final da cidade, isso gera receita?
 
Rodrigo Sabatini – Ações como essa diminuem o custo do município e podem gerar receita dependendo da utilização disso. Mas medidas como essa tiram “um peso político das costas”. Basta imaginar a greve dos garis: eles podem fazer greve a qualquer hora e em três dias o governo tem de resolver a situação.
 
IHU On-Line - Qual a diferença entre lixões e aterros sanitários?
 
Rodrigo Sabatini - O lixão é um buraco em que se joga tudo lá. Depois, existem os aterros controlados, nos quais se coloca terra em cima do buraco. Os aterros sanitários têm uma manta embaixo da terra, onde depois se coloca o resíduo, depois se coloca terra, e assim vai fazendo um sanduíche que depois será lacrado. No Brasil estão investindo em aterros sanitários e, a partir de 2 de agosto de 2014, se analisarmos a lei de forma stricto sensu, veremos que será crime ambiental jogar alguma coisa nos lixões.
 
IHU On-Line - É possível vislumbrar o fim dos lixões num horizonte próximo?
 
Rodrigo Sabatini – Em Santa Catarina, onde moro, não tem lixão faz tempo. Hoje existem os aterros sanitários; é uma questão de planejamento. Mas o problema é que ninguém quer um aterro como vizinho, ninguém quer o lixo perto de si, ninguém que tomar conta do lixo, e esse é um problema sério. Mas a sociedade brasileira, com a PNRS, está pronta para se responsabilizar pelo lixo.
 
IHU On-Line - Neste contexto, como você avalia a situação dos municípios de Santa Catarina?
 
Rodrigo Sabatini – Santa Catarina é um caso à parte, pois não tem lixões faz tempo. O estado já se adequou à parte mais séria da lei, e agora está fazendo os planos.
 
IHU On-Line - Pensando para além do consumidor, qual o papel da indústria na produção de resíduos? É possível minimizar esta produção sem diminuir a produtividade?
 
Rodrigo Sabatini – A indústria é o mais fácil de todos, porque toda indústria séria, competente, está mais próxima do lixo zero. A indústria já é um lugar que tem programa de qualidade total, adoção de ISOsISO 14000, ISO 21000 —, programas de produção limpa, que já deixam as indústrias muito próximas do lixo zero, e é o setor que mais está em direção do lixo zero nesse momento. Diversas indústrias, antes do final do próximo ano, serão lixo zero. O lixo zero nada mais é do que aplicar a lógica industrial, ou seja, nunca misturar, organizar sempre, manter limpo, manter tudo organizado, tudo em dia como em uma indústria.
 
IHU On-Line - Qual a sua visão sobre a inclusão dos antigos catadores como coletores de resíduos sólidos? Essa é a melhor forma de empoderar estes grupos sociais?
 
Rodrigo Sabatini – A política nacional deu uma oportunidade para as pessoas que viviam do lixo, e elas podem contribuir de alguma forma em alguns lugares. Apesar da Política Nacional de Resíduos Sólidos - PNRS ter dado um caráter profissionalizante para o processo de coleta seletiva dos resíduos — porque nós tínhamos um movimento muito amador —, nesses quatro anos pouco se fez para a profissionalização das pessoas que trabalham com o lixo. Não se trata de uma questão de empoderá-los, mas de aparelhar as redes de informações e tecnologias; eles precisam de instrução, de possibilidades. E sobre o aspecto humano da questão, digo que ninguém merece botar a mão no lixo de ninguém. É uma questão de humanidade, de dignidade. Uma pessoa que se sujeita a coletar lixo para sustentar outra é uma pessoa muito digna, mas uma sociedade que permite que alguém viva do seu lixo é uma sociedade indigna.
 
(Por Andriolli Costa e Patricia Fachin) - Unisinos